Inelegibilidade não abalou popularidade de Bolsonaro, apesar da limitação de influência no Congresso
O ex-presidente Jair
Bolsonaro (PL) apostou em uma agenda de viagens pelo Brasil em 2023, com o
intuito de manter-se relevante politicamente, mesmo fora do Palácio do
Planalto, já de olho nas eleições municipais do ano que vem. E pelo que indicam
as recepções que ele tem tido por onde passa, as investigações contra ele no
Supremo Tribunal Federal (STF) e a inelegibilidade imposta a ele pelo Tribunal
Superior Eleitoral (TSE) não foram suficientes para diminuir o apoio dos seus
seguidores mais fiéis. Por outro lado, Bolsonaro enfrentou limitações em sua
capacidade de influenciar parlamentares durante um ano de votações importantes
no Congresso.
Um dos exemplos recentes
que demonstraram a popularidade do ex-presidente foi a recepção calorosa que
teve ao participar, em Bueno Aires, da posse do presidente Argentino, Javier
Milei. Ao chegar ao local, Bolsonaro foi muito aplaudido por brasileiros e
argentinos que gritavam seu nome e empunhavam bandeiras do Brasil. As cenas
contrastaram com a ausência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que
foi convidado para ir à posse de Milei, mas declinou o convite devido a atritos
entre os dois mandatários e a perspectiva de que a presença dele num ambiente
lotado de apoiadores de Bolsonaro e Milei poderia render uma situação
constrangedora, com vaias.
Outro evento recente que
mostrou a popularidade de Bolsonaro foi a entrega do título de Cidadão
Luzianiense, na cidade de Luziânia (GO), em 12 de dezembro. Ao chegar no Centro
Poliesportivo da cidade, Bolsonaro foi ovacionado por uma multidão de
apoiadores. Cenas como essa se repetiram em várias cidades que ele visitou em
2023, como Barretos (SP), Parnamirim (RN) e em Belém (PA).
"A popularidade dele é negócio de outro
mundo", resumiu o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, em entrevista ao
jornal O Diário, em 16 de dezembro.
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popularidade de Bolsonaro
Os casos acima mostram
que a estratégia do Partido Liberal, comandado por Valdemar Costa Netto, em
usar Bolsonaro como principal cabo eleitoral da legenda para 2024 pode ter
êxito significativo no próximo pleito. A sigla almeja eleger mil prefeitos.
Desde quando voltou de
uma temporada de três meses nos Estados Unidos no começo do ano, Bolsonaro
viajou para onze estados: Rio Grande do Sul, São Paulo, Santa Catarina, Goiás,
Minas Gerais, Pará, Rio Grande do Norte, Ceará, Paraná, Rio de Janeiro e Espírito
Santo. Retirando as visitas que faz no Distrito Federal e entorno, São Paulo é
o estado que o ex-presidente mais visitou. Foram cinco visitas a capital e
cidades do interior. Já em Santa Catarina e Goiás, foram três vezes; e Minas
Gerais recebeu o ex-presidente duas vezes.
Segundo Costa Neto, a
agenda poderia até ser mais intensa, mas Bolsonaro, por questões de segurança,
viaja apenas em aviões de carreira, evitando aeronaves fretadas, pelo receio de
algum atentado.
Além das visitas pelo
país, a presença do ex-presidente dentro do Congresso também é vista por
analistas como fator importante para manter sua relevância política. No começo
de dezembro, por exemplo, ele participou do lançamento da Frente Parlamentar em
Defesa das Escolas Cívico-Militares, onde foi recebido por aliados. O evento
também contava com a presença de alunos de escolas militares, que se
surpreenderam quando o ex-presidente o cumprimentava.
Em julho, o programa das
escolas cívico-militares foi descontinuado como política federal pelo Ministério
da Educação. Porém, governadores como Eduardo Leite (PSDB), do Rio Grande do
Sul, e Tarcísio de Freitas, de São Paulo, anunciaram que pretendem continuar
adotando o modelo cívico-militar em algumas unidades das redes públicas
estaduais.
Popularidade de
ex-presidente não evita derrota legislativa
O renome do
ex-presidente, contudo, não impediu que seu partido sofresse derrotas no
Legislativo. A aprovação da reforma tributária na Câmara é um exemplo de que
nem mesmo o PL está totalmente alinhado com o ex-mandatário. Com 96 deputados
na casa, o PL contribuiu com 20 dos 366 votos para a aprovação da proposta na
primeira votação que ocorreu na Casa. Quando a proposta voltou ao plenário da
Câmara, em 15 de dezembro, a legenda novamente orientou voto contra, mas 15
deputados votaram pela aprovação.
Especialmente na
primeira etapa de votação, Bolsonaro foi um dos principais críticos da
proposta. Visitou a Câmara e enviou mensagens a parlamentares alertando para
aspectos que considera negativos na reforma tributária. Essa pressão chegou a
assustar governistas e membros do Centrão, já que a influência do ex-mandatário
em siglas como Republicanos e PP foi avaliada como perigosa para o trâmite da
proposta.
A reunião realizada pelo
PL no dia anterior à sessão da primeira votação na Câmara também deu o tom não
só para adversários, mas também para aliados que estavam apoiando a reforma,
como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Na época, o
chefe do Executivo paulista foi hostilizado por membro do PL após o Bolsonaro
determinar a oposição ao projeto.
Carisma de Bolsonaro
supera perda da inelegibilidade
Com a derrota nas
eleições de 2022, e perdendo o foro privilegiado, o ex-presidente foi alvo de
investigações em relação à sua passagem pelo governo. O caso das joias sauditas
e a delação de seu ex-ajudante de ordens, o tenente-coronel Mauro Cid,
colocaram em cheque a imagem do ex-presidente.
No entanto, as recentes
aparições em público parecem mostrar que a figura de Bolsonaro não foi abalada
para seus apoiadores. Uma pesquisa de opinião divulgada em agosto também
demonstrou que o ex-presidente continua, ao lado de Lula, sendo uma das maiores
forças políticas do país.
A pesquisa AtlasIntel,
publicada no dia 26 daquele mês, mostrava Bolsonaro com 40% das intenções de
voto em uma nova eleição presidencial contra o petista, que obteve nesse
levantamento 48% das intenções de voto. O levantamento também indicou que, para
50% dos eleitores de Bolsonaro, o apoio do ex-presidente a algum outro candidato
seria relevante para que escolhessem em quem votar. E ainda mostrou que
Bolsonaro tem uma imagem positiva para 43% dos entrevistados.
Para o cientista
político Elton Gomes, professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), o
carisma do ex-presidente é um fator importante para entender por que sua
popularidade ainda se mantém apesar das questões judiciais.
“Líderes carismáticos
não costumam ser seriamente afetados por decisões judiciais. O exemplo mais
pujante que se possa ter é o do atual presidente, que foi condenado, preso por
corrupção e ainda assim não só conservou o seu patrimônio político como ainda o
expandiu. Acho que, de certa forma, a mesma coisa pode ser dita para Bolsonaro,
ainda que existam diferenças entre os dois líderes”, disse o professor.
Ele lembrou ainda que
Bolsonaro sabe que as condições para reversão de sua inelegibilidade são
pequenas, mas que mantém as articulações políticas para ter poder de barganha
em negociações para 2026.
“Bolsonaro tem uma visão
muito clara de que não poderá voltar a disputar, pelo menos por enquanto. Então
ele procura manter viva sua figura em reuniões com lideranças estaduais para
que possa negociar seu apoio em 2026 ao candidato que será incumbido de
representar o antipetismo. Além disso, se manter vivo politicamente também tem
implicações para sua própria segurança”.
Na avaliação do
cientista político Adriano Cerqueira, docente no Instituto Brasileiro de
Mercado de Capitais (Ibmec), as denúncias feitas contra Bolsonaro causaram um
efeito reverso à sua imagem.
“Bolsonaro é um fenômeno
de popularidade e que persiste, apesar das várias notícias negativas esse ano,
várias denúncias, investigações visando minar a sua popularidade. Mas essa
perda de popularidade não aconteceu, pelo contrário, está fortalecendo a adesão
do eleitorado do Bolsonaro em torno dele próprio. Isso ocorre porque a maioria
do eleitorado dele está achando que ele está sendo vítima de uma perseguição
política”, disse Cerqueira.
Outro aspecto importante
para o analista é que, apesar das derrotas legislativas, o Partido Liberal está
conseguindo usufruir da imagem do ex-presidente para se estruturar.
“O que o Valdemar está
querendo fazer, claro, é transferir esse prestígio de Bolsonaro para o partido.
De certo modo ele já conseguiu, ao fazer do PL o maior partido, hoje, da
direita. Do mesmo jeito que a esquerda tem um partido de referência, como o PT,
para mim está claro que o Valdemar quer fazer isso com o PL. É um investimento
de curto e médio prazo”, acrescentou o professor.
"O Bolsonaro é um
fenômeno em popularidade e carisma, uma pessoa que causa grande agitação por
onde passa", disse Valdemar Costa Neto em uma entrevista recente ao jornal
O Diário. "Sou grato a ele porque o que ele fez pelo nosso partido não
existe", reconheceu.
Metodologia da pesquisa
citada
O levantamento da
AtlasIntel foi feito a pedido da CNN. As entrevistas foram realizadas em 23 e
24 de agosto de 2023, com 1.232 respondentes. A margem de erro é de 2 pontos
percentuais para mais ou para menos. O nível de confiança é de 95%.
Informações GAZETADOPOVO
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